domingo, 17 de abril de 2011

29 - ENTREVISTANDO JOÃO SOUSA TEIXEIRA ( 2a PARTE )



1-      No primeiro bloco da entrevista, você falou sobre dois livros, ainda não publicados, sobre os quais ainda não estava decidido a fazer divulgação. “Prova de vida”  é um deles ?
O que quis dizer foi que não os apresentei a nenhuma editora, divulgar, vou divulgando… É “Prova de Vida”, sim. O outro original irá chamar-se Possibilidade de Aguaceiros e, lá para 2012, nova ficção com Súbita Floresta.

2-      ”Prova de vida” é uma expressão que faz lembrar de alguma forma a previdência social, a necessidade que o idoso tem de provar que existe.Foi a intenção que presidiu á escolha do nome ?
Essa é para me apanhar.  Os títulos são o que são: normalmente, são uma espécie de chamariz. Ora porque entra bem no ouvido, ora porque é sugestivo ou mesmo inusitado. No caso, tem a ver com o facto de ter escrito um conjunto de textos sobre as memórias de infância (as pequenas coisas que lembram depois na fase adulta) e, logo a seguir, outros sobre momentos importantes da minha vida, como o serviço militar, a intervenção social e cívica, o amor, os filhos, etc. Esta mistura deu o título. Na realidade, como diria Neruda, “confesso que vivi”…


3-      Um dos seus textos, aliás formidável, fala da guerra ao longe: “A guerra”, onde os nossos não morriam nunca.  Fala disso como dum tempo transitório, passado o qual, a vida voltaria á normalidade e tudo retomaria o curso monótono dos dias. ( De alguma forma, isso recorda-me aquelas imagens dos soldados gravando mensagens para a família: “adeus e até ao meu regresso”, fórmulas que alguém encontrava e que se radicavam e passavam  a ser usadas por todos, posturas iguais frente ás câmeras, enfim, estereótipos adotados e disseminados por todos.)É dessa guerra que nos fala ?
Embora essa tenha sido a guerra que vivi do lado de cá (a “minha guerra” já foi a da transição da soberania para os povos das ex-colónias e da liberdade para ambos) o quadro que apresento é justamente o do cinzentismo da ditadura, que enviava os cidadãos armados e para longe, incutindo-lhes que a pátria assim o exigia. Essa guerra foi o dia-a-dia dos portugueses durante quase duas décadas… A propaganda oficial suportava tudo isto com a ideia peregrina de que nós não morríamos nunca, tal como os heróis nos western norte americanos.

4-      Como foi Cabo Verde, do ponto de vista literário?
Naquela altura 74/75 coincidiu a minha disponibilidade total com a chegada a Cabo Verde dos seus filhos no exílio. Por outro lado, a liberdade trouxe convívio, manifestação cultural. Fundou-se o Novo Jornal, o No pincha, jornal do PAIGC, passou a ter circulação legal, a rádio teve uma lufada de ar fresco… Enfim, foram abertos os portões do Tarrafal. Entretanto, os escritores e poetas da diáspora juntavam-se em tertúlia, à tarde, na Pracinha. Recordo algumas conversas com Ovídio Martins , poeta e jornalista, a quem a PIDE (polícia política) torturou ao ponto de ter ficado quase completamente surdo. Quanto ao resto, era a azáfama semanal com o jornal e a produção poética, que na altura foi bastante profícua.

5-      Claramente, João, há uma maturidade especial nos seus textos deste livro.  Sente isso, ou é suposto serem os outros a sentir ?
Se esse sentimento for comum, tanto melhor. Pessoalmente, tenho consciência dessa maturidade literária e quero partilhá-la. Se os meus leitores ficarem satisfeitos com a sua leitura, eu ficarei também.

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