terça-feira, 1 de março de 2011

19 - APRESENTAÇÃO DO POETA DO DESERTO

         
            
               Apresentamo-lhes nosso convidado do mês, o poeta brasileiro do Estado de Pernambuco, Felipe Padilha di Freita, “O poeta do deserto”. Felipe tem estilo singular de fazer poesia, usando a palavra com total liberdade e sem nenhum compromisso com as convenções, cria neologismos com facilidade, o que traz intensidade e encanto aos seus textos, que variam desde as inquietações da sua própria alma, até o seu olhar atento para as mazelas sociais, sempre com o brilho da sua aura, o fervor da sua mente, o encanto do seu poetar sobre suas singelas divagações.
          Eis que do deserto, o palco que ele elege para mostrar as dificuldades de levar a palavra ao coração do homem, de cada grão pisado na areia quente, das bolhas nos pés de seu caminhar, nasce assim como a um cactus, de um verde singularmente extasiante, contrastando ao beje da paisagem árida. Não é dos espinhos do cactus que lhe vejo em semelhança, é na capacidade de armazenar a água que o sustenta, assim como a sua alma que guarda silente, a substância que alimenta a sua brilhante mente. De sua mente vertem fluidos de sons e tons, numa energia vibrante, sobretudo, contagiantemente harmônica.
Celêdian Assis


A seguir, textos de Felipe Padilha di Freita (O poeta do deserto)


DISFARÇADAMENTE POETA

Sou escritor teimoso, que embromo com meu pensar, misturo palavras incertas, se encanto não sei falar, sou deveras um persistente, meu verbo é tão só tentar, não sei se agrado a todos, a simplicidade comigo está;

Um dia pensei comigo, uma forma de externar, as idéias dos calabouços, na mente não vão ficar, unindo letras é que encontro a forma de esboçar, a arte que mui pouco entendo, quero apenas me libertar;

Liberto-me dos devaneios, para indagações arrumo lugar, amores que tive ou não tive, a importância de se questionar, sarcasmo é companheiro, as dores que fazem chorar, as belas estrofes alegres ajudam-me a não parar;

Escrevo para mim mesmo, prazer é finalizar, meu clímax monossilábico, indescritível sentir me dá, palavras entrelaçadas aguçam um poetar, por isso me atrevo escrevendo tão só a imaginar, que sou mesmo algum poeta, transcendente idealizar;

Pessoa tinha talento, e sabia exemplificar, a dor que deveras se sente, o poeta quer camuflar, não sabe inocente este, que dele mesmo não se vai fugir, as entranhas e os avessos entregam qualquer sangrar;

E em meio à teimosia continuo o meu caminhar, sou amante dos atrevidos,
latejante é meu indagar, poesia é o acalento, o que estimula o meu sonhar,
de algum dia ser um poeta e com as palavras poder brincar, pois,
brincando de assim o ser, poderia assim disfarçar, e enfim,
disfarçadamente, ser poeta e ninguém notar.


O POETAR DE UM MENDIGO

Duro chão que sustenta minhas cansadas pernas 
e o meu repousar em um papelão;
Suave chuva que limpa minhas chagas, mas, que congela o meu corpo cão;
Frio e azedo rodízio com excremento, degluto com ânsia com a palma da mão;
Olhares penosos que me acompanham, moedas minguadas em meu calção;
Se tive sonhos já não recordo, hoje só lembro da solidão;
Pedir esmolas é o que tento, é o que me resta de opção;
Estou muito velho e não suporto, o pesado fardo que dito em vão;
Continuarei sendo ignorado, um poeta fétido na aflição,
farrapo humano despedaçado, triturada e seca desilusão,
nem o sol aquece o meu dia a dia, nem meu poetar é a solução,
aguardo o fim desses meus dias, morrerei de fome ou me matarão.

O MENINO QUE QUERIA SER POETA

Menino humilde, franzino, em meios aos seus desatinos,
desestimulado pelo seu árduo destino,
aprendeu a escrever com apenas um desígnio,
em meio à sofridão do divagar sem riso,
mãos com fome a tremular rabiscos,
 barriga oca com um esperançar aflito,
religando letras de um futuro escondido,
sem sonhos, com dramas travestidos em pueril criança.
Árido chão a mais real lembrança,
caçamba vazia remetendo à bruta andança,
 chão corroído e sem boa aventurança,
desabrochar em um suspiro sem herança,
sem bonança, pratos cansados em aguardar substância,
sol que queima inspirando as letras que dançam,
 em papéis catados na vizinhança,
outros doados pelos que acreditavam nos delírios de uma criança,
 que tinha um sonho a mais tênue confiança,
de viver desse dom, quase impossível relutância,
se entorpecia em um soletrar que alcançava a mais sublime
 e a mais transcendente adivinhação.
Termino esta poesia na espera da mais que divina comprovação,
a guardarei em um cantinho mais que secreto e também em meu coração,
desculpe a pouca métrica, a falta de paragrafação, o pobre acentuar,
e o descompassar nas pressas de minha emoção,
só a mostrarei se minha meta, um menino franzino que queria ser poeta,
se consolidar neste meu mundo cão,
onde o que me nutre são as rimas
e o poetar é minha única e farta alimentação.

Dedico esta poesia a todos que acreditam incessantemente na arte que brotam dos seus corações e que a fazem o refúgio mais que certo da real libertação. Aqueles que não desistem dos seus dons, de suas vocações e definitivamente dos seus sonhos!
(O POETA DO DESERTO)

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